«PPP custam 10 anos de subsídios» - CM 23/1/14
Clique na imagem para ampliar.
Comentários desligados
Clique na imagem para ampliar.
Comentários desligados
Clique na imagem para ler mais artigos.
Comentários desligados
Fe inquebrantable
«A Su Santidad el Papa Francisco: en el nombre de nuestro Señor omnipotente y glorioso, yo Asia Bibi, le expreso mi más profunda gratitud a Dios y a usted, Santo Padre. También espero que todo cristiano haya podido celebrar con alegría esta Navidad. Al igual que muchos otros presos, también yo celebré el nacimiento del Señor en la cárcel de Multan, aquí, en Pakistán…».
(Portaluz/InfoCatólica) Así comienza la carta publicada por «Avvenire» que Asia Bibi -una madre paquistaní de fe católica condenada a muerte por blasfemia-, dirigió al Papa Francisco. La mujer, que está esperando el proceso de apelación que deberá juzgarla se encuentra en prisión desde hace cuatro años y medio.
«Me gustaría agradecer -dice Asia al Papa desde Multan- a la Fundación Renacimiento de la Educación que ha hecho realidad el sueño de vivir la Navidad con mi marido y mis hijos, trayéndolos aquí a Multan. Me hubiera gustado estar en San Pedro para la Navidad para orar con usted, pero confío en el plan que Dios tiene para mí y tal vez permitirá que cumpla el año que viene».
«Estoy muy agradecida de toda la Iglesia que está orando por mí y que lucha por mi libertad», continúa la carta. «No sé cuánto tiempo podré seguir adelante. Si estoy aún viva es gracias a la fuerza que sus oraciones me dan. He conocido a muchas personas que hablan y luchan por mí. Lamentablemente todavía no hay resultados. En este momento sólo quiero confiarme a la misericordia de Dios, que todo lo puede. Sólo Él puede liberarme».
Asia Bibi también agradece en su carta al Papa a todas las personas que trabajan y recaudan fondos para su causa. A continuación, habla de sus problemas cotidianos. «Este invierno me estoy enfrentando a muchos problemas: mi celda no tiene calefacción ni una puerta adecuada para resguardarse del intenso frío, tampoco las medidas de seguridad son adecuadas; no tengo recursos suficientes para las necesidades diarias y estoy muy lejos de Lahore, por lo que mi familia no me puede ayudar. Por último Santo Padre, deseo pedirle que acepte mis mejores deseos para el nuevo año. Sé que usted ora por mí con todo el corazón. Y esto me da la confianza de que un día mi libertad será posible. Con la seguridad de que me recuerda en sus oraciones, lo saludo con afecto. Asia Bibi, su hija en la fe».
Comentários desligados
Apresentação do livro
As palavras da Palavra: Dicas sobre as parábolas de Jesus
De Padre Gonçalo Portocarrero de Almada e Zita Seabra,
Com Notas Exegéticas de P. Geraldo Morujão e Desenhos de Inês Moura Paes
Lisboa, Teatro de São Carlos, 12.13. 2013
O livro que me cabe hoje aqui apresentar é um livro cheio de lições importantes e duradouras.
Uma das que apreendi logo que comecei a ler este livro foi que, antes de aceitar apresentar um livro, devemos lê-lo. Eu não tinha lido este livro antes de aceitar o amável convite da minha querida amiga Zita Seabra para o apresentar. E quando comecei a lê-lo, comecei a perceber que tinha sido um grande disparate da minha parte ter aceitado vir aqui apresentá-lo. Eu simplesmente não estou preparado para dizer nada que acrescente alguma coisa ao excelente -- excelente e surpreendente -- livro que hoje aqui nos traz.
O disparate foi meu, sem dúvida, embora continue altamente intrigado sobre as razoes por que terei sido escolhido para o apresentar. Mas, repito, o disparate foi meu, por ter aceitado. Não terá sido, todavia, um disparate em vão. Embora eu não tenha grande coisa para vos dizer sobre este livro, a verdade é que aprendi já muito -- e fui levado a reflectir muito e a interrogar-me muito -- com este livro.
"As palavras da Palavra: Dicas sobre as parábolas de Jesus" é, como o nome indica, um livro sobre as parábolas do Novo Testamento. São 29 capítulos sobre 29 parábolas. Cada capítulo inicia-se com um desenho de Inês Moura Paes e a reprodução de uma parábola, seguida de uma breve nota exegética da autoria do Senhor Padre Geraldo Morujão, após o que se inicia uma intensa conversação entre Zita Seabra -- que faz perguntas, mas também comenta e discute as respostas e reflexões do Senhor Padre Gonçalo Portocarrero de Almada. São 445 páginas de intensa conversação sobre e a partir das parábolas de Jesus, mas que nos levam a uma viagem intelectual sobre os mais diversos problemas da vida espiritual, moral, cultural, política e económica -- do presente, do passado e também de certa maneira do futuro.
A citação inicial de Bento XVI exprime de certa forma o intrigante apelo deste livro. Bento XVI começa por dizer que "as parábolas constituem, sem dúvida o centro da pregação de Jesus". E acrescenta que "acontece connosco o mesmo que se verificava com os contemporâneos de Jesus e com os seus discípulos: temos de perguntar-Lhe sempre de novo o que é que nos quer dizer com cada uma delas (Mc 4, 10)".
É de facto esta interrogação permanente que acontece ao longo deste livro e que nos interpela, levando-nos a uma nova interrogação. Zita Seabra interpreta este desafio interrogativo das parábolas como "um espaço de liberdade, de criatividade e de poesia ... Pequenas histórias, frequentemente provocatórias e, muitas vezes, inverosímeis, mas cheias de surpreendentes ensinamentos. Não há fundamentalismo possível na interpretação das parábolas -- conclui ela -- porque não são passíveis de uma única interpretação por biblistas ou teólogos."
Por seu turno, o senhor Padre Gonçalo Portocarrero de Almada sublinha que "nenhuma interpretação esgota nenhuma parábola". Simultaneamente, recorda o papel central das parábolas na transmissão de um ensinamento, ensinamento que se torna mais real através da parábola:
" Por exemplo, se não houvesse a parábola do Filho Pródigo, seria muito difícil perceber o que é a misericórdia de Deus. Seria impossível entender o perdão de Deus, o que significa a conversão, e , até, compreender o que é a filiação divina, ou seja, o que quer dizer sermos filhos de Deus. Se Nosso Senhor dissesse que o seu amor por nós é misericordioso, nós com certeza que acreditaríamos e não teríamos qualquer dúvida. Mas, poderíamos questionar: o que é que se quer dizer quando se afirma que Deus "é misericordioso"? Se Deus nos dissesse que está disposto a acolher o pecador, nós acreditaríamos. Mas como é que Ele recebe o pecador? Até que ponto é que Ele esquece? Até que ponto é que ultrapassa o agravo, ou a ofensa, de que foi objecto? A parábola do Filho Pródigo é, de facto, mais rica do que qualquer explicação teórica acerca da misericórdia divina ou o perdão de Deus" (p.15).
O amor de Deus e a misericórdia divina estão de facto no centro da mensagem cristã, que reaparece ao longo de inúmeras parábolas. Mas é um amor e é uma misericórdia que são simultaneamente exigentes -- e é talvez esse um dos aspectos mais interpelantes da mensagem cristã. Recusa a intransigência dos fundamentalismos e, ao mesmo tempo, recusa o laxismo ou a indiferença do chamado " deixa andar" tão do agrado das novas terapias da chamada auto-estima -- que são igualmente discutidas neste livro.
O senhor Padre Portocarrero de Almada exprime eloquentemente esta dupla mensagem do amor cristão quando explica que
"A Igreja é mãe. E, as mães são, ao mesmo tempo, carinhosas e compreensivas, mas também exigentes. A Igreja é exigente e requer um propósito sério de contrição. Mas, ao mesmo tempo, se por fraqueza, se por veleidade, voltarmos a cair, a Igreja está sempre pronta para nos poder acolher, para, em nome de Deus, nos perdoar e animar" (p. 160).
Julgo que nesta tensão entre misericórdia e exigência se encontra uma das chaves da mensagem cristã e uma das chaves do seu surpreendente sucesso pacífico ao longo dos últimos dois mil anos -- do qual resultou a nossa civilização cristã ocidental. Zita Seabra lembra a este propósito um texto muito expressivo sobre o que é ser cristão, a Carta a Diogneto, do século II, de autor desconhecido. Diz essa carta:
"(Os cristãos) habitam pátrias próprias, mas como pregrinos; participam de tudo, como cidadãos, e tudo sofrem como estrangeiros. Toda a terra estrangeira é para eles uma pátria e toda a pátria uma terra estrangeira. Casam como todos e geram filhos, mas não abandonam à violência os neonatos. Servem-se da mesma mesa, mas não do mesmo leito. Encontram-se na carne, mas não vivem segundo a carne. Moram na terra e são regidos pelo céu. Obedecem às leis estabelecidas e superam as leis com as próprias vidas. Amam todos e por todos são perseguidos" (p. 26).
Terá sido esta atitude tão exigente e ao mesmo tempo tão tolerante que permitiu à inicial minoria cristã civilizar o Ocidente -- e, por essa via, tornar o Ocidente simultaneamente tão atractivo e tão preocupante para outras culturas e civilizações. Como recorda o senhor Padre Portocarrero de Almada,
"O cristianismo teve um papel muito importante na moralização dos costumes sociais. Até a eutanásia era praticada, na Grécia, onde as crianças recém-nascidas eram postas ao relento na primeira noite, para ver se aguentavam: se vingassem, então valia a pena criá-las, mas se morressem, enterravam-se. (...) quando o cristianismo aparece no Império Romano praticavam-se bastantes brutalidades. Basta pensarmos que se admitia a escravatura, o circo, em que se sacrificavam vidas humanas, etc (...) Quando os europeus chegaram à América, dita Latina ou América do Sul, faziam-se lá sacrifícios humanos, de rapazes e de raparigas que eram oferecidos aos deuses. Isto acontecia numa civilização que era tida como já desenvolvida, mas que era capaz de fazer uma coisa tão selvagem, tão brutal, tão cruel que, obviamente, na Europa há muito que já não acontecia" (p. 23).
Este tema da centralidade da vida humana, da pessoa humana, conduz-me a uma nota final, com que gostaria de concluir estas breves palavras. Como sabem, tenho ocupado, ao longo dos último 3 anos, a cátedra Geremek em Civilização Europeia no Colégio da Europa, em Varsóvia. No centro desta cátedra está o estudo da Civilização Europeia em geral e, em particular, no século XX, em homenagem ao Professor polaco Bronislaw Geremek, que era ele próprio um estudioso da Europa medieval, tendo sido também um decisivo protagonista do movimento Solidariedade e um dos primeiros conselheiros do célebre Lech Walesa. Geremek era judeu e escapou por um triz do gueto de Varsóvia. Mas ele considerava que o cristianismo constitui a matriz fundamental da civilização europeia e ocidental e que no centro dessa civilização está o respeito pela dignidade da pessoa humana.
Os polacos são particularmente sensíveis a esta proposta de Geremek porque eles sentiram tragicamente ao longo do século XX a negação desta mensagem cristã fundamental. Essa negação foi perpetuada, diríamos apropriadamente executada, por duas ideologias pagãs -- o nacional-socialismo e o comunismo -- que espalharam a morte e a perseguição pela Polónia duplamente invadida.
A política desses fundamentalismos rivais assentava na recusa frontal da cultura de equilíbrio inerente ao cristianismo. Esta noção de equilíbrio era associada pelos nazismo e pelo comunismo àquilo que designavam por decadência burguesa e capitalista, por eles sobretudo atribuída ao chamado capitalismo judaico-anglo-saxónico. Esta misteriosa entidade era então acusada de contaminar os elevados ideais -- de uma cultura trágica e heróica, no caso do nazismo, e de uma cultura colectivista e igualitária, no caso do comunismo -- com o vírus personalista da ambição melhorista individual.
Associada a esta revolta fundamentalista do nazismo e do comunismo estava uma comum ideologia cientista e um profundo desprezo pelos mandamentos de compaixão e misericórdia da mundividência cristã. Esta era acusada também de cumplicidade com o mundo decadente e burguês, um mundo que pertenceria a um passado conservador e contrário à nova era da técnica científica.
Este cientismo pagão revestia-se de diferentes modalidades. No caso do nazismo, assentava basicamente no culto da eugenia racista e no desprezo brutal por todos os comportamentos que parecessem débeis, frágeis ou desviantes. No caso do comunismo, tratava-se da chamada ciência da história, uma superstição teleológica que assegurava aos iniciados a chave do desenvolvimento futuro das sociedades -- e, com ela, a legitimidade "científica" para literalmente varrerem tudo o que se lhes opusesse.
Em nome destes fanatismos rivais, nazismo e comunismo destruíram a democracia na Europa central na década de 1930. Sabemos hoje que os nazis mataram deliberadamente 11 milhões de não-combatentes, dos quais cerca de 5,4 milhões de judeus -- 2,6 milhões a tiro, 2,8 milhões em câmaras de gás. Para os soviéticos, no período de Staline, os números de não-combatentes deliberadamente assassinados ascendem de seis a nove milhões.
A brutalidade destes números evidencia o premonitório alerta lançado no século XIX pelo grande historiador britânico, Lord Macaulay, quando anteviu as consequências de uma eventual erosão do horizonte judaico-cristão de uma civilização dominada exclusivamente pela técnica: "a aterradora ameaça de uma civilização técnica destituída de misericórdia".
Meus Caros Amigos,
Não quero banalizar o mal do comunismo e do nazismo e, por isso, não devo estabelecer comparações ligeiras com a atmosfera cultural em que vivemos actualmente. Mas o excepcionalismo do mal comunista e nacional-socialista deve recordar-nos as consequências de uma civilização técnica sem misericórdia, como dizia Lord Macaulay.
Num tempo de triunfo da técnica comunicacional, de satisfação instantânea, de culto da vulgaridade e das celebridades mediáticas, de culto do facilitismo e do sucesso fácil, talvez seja boa altura de pararmos para reflectir sobre as mensagens intrigantes que inspiraram a nossa civilização europeia e ocidental. Talvez seja altura de pararmos para parabolar com estas 445 desafiantes páginas que nos propuseram o senhor Padre Gonçalo Portocarrero de Almada e Zita Seabra.
Muito obrigado.
Comentários desligados
Comentários desligados
Comentários desligados
http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=674198
11-12-2013 às 18:39
Na introdução, Portocarrero de Almada chama à atenção para facto de que «Jesus nada escreveu», mas «lançou aos ventos do mundo e da história a semente da Palavra, nas palavras das suas parábolas».
«As palavras da Palavra. Dicas sobre as parábolas de Jesus», do padre Gonçalo Portocarrero e Zita Seabra, é apresentado pelo catedrático da Universidade Católica João Carlos Espada, na quinta-feira, às 18:30, no Teatro Nacional de S. Carlos, em Lisboa.
A obra é escrita em diálogo, em que Zita Seabra interroga o sacerdote sobre a utilização das parábolas, ou determinado ensinamento que se deve retirar de uma parábola.
Para Zita Seabra, «as parábolas são um espaço de liberdade, de criatividade, de poesia, de verdadeira escrita criativa -- como é moda dizer-se».
Jesus, todavia, contou essas parábolas para «ensinar os princípios da fé e da moral cristã e para nos introduzir na relação com o eterno», sustenta.
«Insólitas», «fantasiosas» ou «espantosas contradições» e «que raiam, por vezes, o absurdo», as parábolas «interpelam e provocam os ouvintes», afirma Zita Seabra.
Por outro lado, defende, estas histórias que Jesus contou, que os discípulos registaram e a memória dos cristãos fixou, não são «letra morta, nem narrações efémeras, porque nos aproximam sempre do eterno».
Portocarrero, no diálogo com a sua interlocutora, atesta que as parábolas são dos textos, "cuja autenticidade está melhor comprovada» e sublinha: «Todo o fundamentalismo parece-me ser uma perversão da própria palavra».
«A palavra deve ser entendida num sentido vivo, num sentido dinâmico, não apenas no seu sentido literal», frisa o sacerdote.
Zita Seabra, por seu lado, afirma, que «não existe teólogo, e sobretudo nenhum fundamentalista que possa dizer fixei o texto e garantir que a interpretação oficial de uma determinada parábola está estabelecida».
As parábolas são, defende Portocarrero de Almada, «um espaço de liberdade», uma «zona de livre interpretação».
Gonçalo Portocarrero de Almada, de 55 anos, é sacerdote desde 1986, ministério que exerce no âmbito da prelatura do Opus Dei, autor de várias obras e artigos, é coautor Com Zita Seabra é coautor de «A Igreja na Inquisição da opinião pública», livro editado no ano passado.
Editora livreira, Zita Seabra, ex-deputada do PCP e do PPD/PSD, partido no qual ainda hoje milita, escreveu as suas memórias em 2007, com o título «Foi assim». Anteriormente, tinha publicado, em 1988, «O nome das coisas». Dirigiu as editoras Quetzal e Bertrand, tendo fundado, em 2005, a Alêtheia, que chancela esta obra.
Diário Digital com Lusa
Comentários desligados
Eis que chega o resultado da primeira oficina de escrita de Manuela Gonzaga que a Livraria Alêtheia recebeu. Parabéns às participantes e autoras desta fantástica antologia!
Comentários desligados
É mais do que uma biografia, é um registo reflectido sobre uma época. Ora em traços largos, ora em pormenor, Adelino Cunha conta a história política recente de Portugal. O pretexto é a vida política de Guterres.
"Guterres tinha prometido voltar ao asilo 28 e Maio depois das eleições de Dezembro de 1993 e cumpre a promessa no mês seguinte. No alto de uma colina no Porto Brandão, o prédio decrépito torna-se num símbolo da miséria humana à porta dos grandes centros urbanos. ‘Dificilmente se encontrará em Portugal um sítio onde a dignidade humana esteja tão espezinhada’, lamenta Guterres." (p.350)
O discurso humanista, proferido num quadro de miséria - exposto no regresso ao lugar de campanha eleitoral, depois da vitória autárquica, destapando uma ferida social que afinal continuava a existir debaixo do oásis do cavaquismo -, é o traço da diferença na maneira de fazer política que têm caracterizado António Guterres ao longo da sua vida política e cívica, a qual surge retratada na obra António Guterres - Os Segredos do Poder, da autoria de Adelino Cunha, editado pela Alêtheia.
O pretexto é a biografia política do antigo primeiro-ministro (1995-2002), líder do PS (1992-2002), várias vezes deputado à Assembleia da República e actual Alto-Comissário nas Nações Unidas para os Refugiados. O resultado é um retrato de uma época, feito ao longo de 582 páginas, com uma dinâmica de escrita que prende, mesmo quando o autor decide abordar minuciosamente as polémicas que opuseram protagonistas políticos. Uma precisão: a maioria das falhas que foram apontadas, não se confirmam na leitura da obra.
Adelino Cunha partiu para esta obra, depois de fazer o seu livro A Ascensão ao Poder de Cavaco Silva (2005). "Quando fiz o livro sobre Cavaco tinha o projecto de fazer um livro sobre Guterres, mas, entretanto, quando o fazia, surgiu o convite da Esfera dos Livros para fazer o livro sobre Álvaro Cunhal [Álvaro Cunhal - Retrato Pessoa e Íntimo (2010)] e, para isso, parei este projecto", explica ao PÚBLICO.
Na primeira fase, até 2008, ficou preparado "o corpus documental", explica Adelino Cunha ao PÚBLICO. Uma investigação a que somou trinta entrevistas com alguns dos protagonistas de diversos momentos da vida de Guterres, feitas ao longo de 2007, mas também, é evidente com o próprio ex-primeiro-ministro. Mais recentemente, na fase de finalização, investigou os períodos subsequentes. A liderança do ACNUR e ainda uma projecção no futuro: "A última pergunta que lhe fiz foi sobre a candidatura a Presidente da República."
O autor revela ainda alguns segredos da sua empreitada, que foi feita em diálogo com o biografado. "O método foi ir fazendo os conteúdos e mandar para Guterres para ele os comentar", explica, em jeito de resposta implícita ao facto de Guterres ter feito uma declaração escrita afirmando não se rever na obra.
Confessa estar ciente de que no resultado final pesa o facto de ter feito a investigação e as entrevistas em 2007. "Se as entrevistas tivessem sido feitas depois, seria outro livro. Hoje, não falariam assim. Mesmo a resposta que Guterres dá sobre a sua sucessão, quando ele diz que indicaria José Sócrates, é preciso ver que na época em que ele me diz isto, Sócrates era primeiro-ministo", assume Adelino Cunha, referindo as declarações que Guterres lhe prestou sobre a sua demissão em Dezembro de 2002 e sobre o facto de não ter aceitado satisfazer o pedido do Presidente Jorge Sampaio para que o PS nomeasse um sucessor: "Se eu concordasse com indigitações teria proposto naquele momento José Sócrates para me suceder como primeiro-ministro, mas era preciso haver eleições no PS e no país." (p. 567-8)
Se o livro conta a história de vida pública e política de Guterres, fá-lo no que é a reconstituição pormenorizada das épocas abordadas. É assim possível perceber o contexto da evolução de Portugal nos últimos cinquenta anos, através da retractação feita do ambiente dos jovens intelectuais antes do 25 de Abril e sobretudo do que é a história não só do PS, mas também do PSD e do CDS.
É a imagem de um ser racional, que calcula cada passo com prudência e sem se deixar levar pelo entusiasmo dos holofotes que é apresentado. Vemos reconstituído - pelo próprio e por vários dos que com ele viveram esses momentos -, o percurso do jovem brilhante estudante do Instituto Superior Técnico. Mas também do activista da Juventude Universitária Católica, que se destaca, antes do 25 de Abril, nas acções de apoio às vítimas das Cheias de 1967 (p. 54), é e namorado por organizações como a Opus Dei, cujas acções de formação e retiros frequenta (p. 33 ss.), ou a Assistência Social da Mocidade Portuguesa (p. 63 ss.). E o membro do Grupo da Luz, bem como o dirigente da Sedes e o fundador da DECO.
"Em estado de choque"
A história de militante político é o prato principal desta obra. António Manuel de Oliveira Guterres, nascido a 30 de Abril de 1949, na freguesia de Santos-o-Velho, em Lisboa, entra no PS pela mão de António Reis. É impressionante a capacidade, a segurança e a discrição com que Guterres construiu uma carreira política. Primeiro, junto ao grupo do Secretariado, liderado por Salgado Zenha, no combate a Mário Soares, líder-fundador que o afasta até do Parlamento. Depois, no apoio a Vítor Constâncio. E ainda a Sampaio. Sempre como o responsável pela organização, que é como quem diz, como o homem que domina a máquina do partido.
Até que, em 1991, Sampaio ficou submerso pela segunda maioria absoluta de Cavaco e Guterres proclamou: "Estes resultados deixam-me em estado de choque." (p. 322) Começa então a ascensão partidária que o levará a liderança do PS e do Governo da Nova Maioria, que marcará o país, com o seu discurso e acção social. Pelo livro passam as apostas em medidas como o Rendimento Mínimo Garantido (p. 349) ou a Paixão da Educação (p. 364). Uma ascensão assente em moderno marketing político. "As pessoas estão primeiro", é uma das frases de propaganda, a que se segue: "Os portugueses não são um negócio, são pessoas e Razão e Coração" (p. 346).E em que o PS rompeu as paredes do partido e comunicou com a sociedade para construir a "Nova Esquerda" nos "Estados Gerais".
Um percurso construído também internacionalmente, com o brilho da adesão ao euro, com o chapéu-de-chuva ideológico da Terceira Via e com o apoio de Bill Clinton e Tony Blair (p. 486). E que passa pela Estratégia de Lisboa (p. 506) e pela independência de Timor (p. 488), levando a que seja equacionado o seu nome para presidir à Comissão Europeia, convite que recusa, devido à morte da primeira mulher (p. 501 ss).
Os seis anos de governação são recordados em conjunto com a acção das oposições e dos Presidentes Soares e Sampaio. Incluindo uma pormenorizada enunciação do desgaste dos últimos dois anos, falhada que foi a conquista da maioria absoluta em 1999. Em congresso, António Vitorino desafiara Guterres a pedir uma "maioria inequivocamente absoluta". Na campanha para as legislativas de 1999, Guterres apenas pede uma "maioria absolutamente inequívoca". (p. 466) Com 115 deputados, o poder dos socialistas foi-se esbroando em sucessivas crises, dos Orçamentos Limiano (p. 523 ss.) à Taxa de Alcoolémia (p. 546).
A obra de Adelino Cunha traça as várias facetas de uma vida em interacção com o seu contexto histórico. Mas tem presente que a história de Guterres não acabou. É por isso que o autor não deixa de lembrar o pedido de desculpas público que o ex-primeiro-ministro fez em entrevista à televisão em finais de 2012 - o único antigo chefe de Governo a fazê-lo até hoje em Portugal: "Todos aqueles que exerceram funções em Portugal têm uma responsabilidade no facto de nós, até hoje, ainda não termos sido capazes de ultrapassar esses défices tradicionais, essa incapacidade tradicional para competir em plano de verdadeira igualdade com os nossos parceiros, nomeadamente no quadro europeu." (p. 447)Comentários desligados
A lei do preço fixo foi aprovada há uns anos para regular um sector cultural determinante – o livro. No entanto, deu lugar recentemente a uma situação de desregulação completa que se pode resumir com facilidade: a lei não é cumprida pela FNAC, nem pela Bertrand (as grandes cadeias de venda ao público de livros), mas é cumprida pelas livrarias independentes.
Recorde-se que a lei estabelece que o livreiro é obrigado a manter o preço fixo de um livro estabelecido pelo editor durante 18 meses após a publicação e apenas pode praticar, se o desejar, um desconto de 10%. No entanto, as duas cadeias referidas que dominam o mercado fazem descontos diversos, envolvendo novos títulos, sem se preocuparem com a lei, enquanto os outros não o podem legalmente fazer.
Acresce ainda que os livreiros independentes ou as pequenas cadeias de livrarias nunca conseguirão comprar livros nas condições destas duas grandes cadeias, porque a lei da concorrência também não funciona em Portugal. No caso dos livros, tal acontece por vários motivos, um dos quais está precisamente no facto de existir uma lei (dita) mais rigorosa, para defender as livrarias independentes, precisamente a lei do preço fixo do livro. Assim seria efectivamente, se a lei fosse cumprida. Sucede, porém, que não é.
Do ponto de vista do editor independente, esta situação não é menos grave que para os livreiros, pois existe abuso inegável de posição dominante de cadeias que estão presentes em todo o percurso de um livro, desde a recepção do original até ao posto de venda, o que não acontece em nenhum país europeu que se preze e defenda a sua cultura, como fazendo parte da sua identidade cultural.
Morreram todas as históricas livrarias de referência no país e actualmente sobrevivem apenas algumas novas e corajosas apostas, também elas condenadas, porém, a viverem a prazo, com morte anunciada. Como dizia alguém, estas livrarias são uma espécie de talho de carne de porco na Arábia Saudita…
Se a isto juntarmos o facto de as grandes cadeias de livrarias terem deixado de o ser, objectivamente, para passarem a vendedores "remax’s" de centímetros de prateleiras, de bocadinhos de montras, de bocadinhos de panfletos comerciais, de quadradinhos de topos, de metade do espaço de um livro numa estante, de centímetros de mesa para caber uma lombada estreitinha, de fotografias em folhetos, e o esmagamento da margem dos editores, temos o panorama do sector livreiro do país. Mas há ainda pior: além disso, tentam até comprar o poder político ou a influência nas associações profissionais, não vá o diabo tecê-las.
Aqui chegados, restam dois caminhos: ou se aplica a lei do preço fixo a todos e não apenas aos independentes e aos pequenos, ou se revoga a lei do preço fixo de imediato e se faz cumprir a lei da concorrência, forçando toda a gente a comprar o que vende rigorosamente nas mesmas condições e com as margens que muito bem entender.
A situação a que chegámos, essa sim, é inaceitável num Estado de Direito, porque se traduz na consagração da "lei da selva". Resta saber o que faz a Secretaria de Estado da Cultura neste domínio, porque não está a exercer, como lhe compete, as funções reguladoras do mercado. No caso dos livros que vivem independentes do Estado (excepto o livro escolar), a Secretaria de Estado da Cultura ao menos que exerça o papel de regulador que ninguém pode exercer em seu lugar. Até porque essa função reguladora não precisa de verbas extraordinárias no Orçamento do Estado.
Alêtheia Editores
Comentários desligados