Reis de Portugal e sua Descendência | Volume 2 - 1º capítulo

Publié par Rita Martins le

 D. LUÍS I (1838 — 1889)

 

Com a colaboração de: António Sérgio, Pedro Batalha Reis, Afonso Zúquete

 

Trigésimo-primeiro rei de Portugal, D. Luís I nasceu em Lisboa, no Palácio das Necessidades, a 31-10-1838 e morreu na Cidadela de Cascais a 19-10-1889. Foi batizado na Capela das Necessidades a 14-11‑1838, com o nome completo de Luís Filipe Maria Fernando Pedro de Alcântara António Miguel Rafael Gabriel Gonzaga Xavier Francisco de Assis João Augusto Júlio Volfando, tendo tido como padrinho o rei de França, Luís Filipe. Foi cognominado o Popular.

Até à morte do irmão, o rei D. Pedro V, foi o infante D. Luís o 1.° duque do Porto e duque da Saxónia. Destinou-o a mãe à carreira da armada, não simplesmente como oficial de marinha honorário, mas como prático. Quando faleceu D. Maria II (15-11‑1853) contava D. Luís 15 anos de idade, e D. Pedro, o irmão mais velho, 16, faltando a este apenas 2 para atingir a maioridade, segundo a Constituição do país. Ficou o pai, D. Fernando, regente do reino, e os dois irmãos logo empreenderam uma viagem pelas cortes europeias. Saíram do Tejo no vapor Mindelo em maio de 1854, foram diretamente a Londres, e de aí passaram à Bélgica,

Holanda, Prússia, Áustria, França, Saxe-Coburgo-Gotha, voltando depois a Londres, de onde regressaram a Lisboa. Pela rainha Vitória foram recebidos com particular carinho.

No ano seguinte realizaram outra viagem, visitando algumas das cortes onde já haviam estado no anterior, e também a Itália e a Suíça. No regresso, o príncipe assumiu o governo (16-9‑1855), com o nome de D. Pedro V, no próprio dia em que fazia 18 anos de idade. Quanto a D. Luís, foi investido no comando do brigue Pedro Nunes, e depois no da corveta Bartolomeu Dias, da qual era o verdadeiro comandante o seu precetor naval, o então capitão-de-mar-e-guerra, depois almirante, António Sérgio de Sousa, visconde de Sérgio de Sousa. Nesse navio visitou os nossos portos africanos, designadamente os de Angola. Regressado à Europa, e promovido ao posto de capitão-de-fragata (24-3‑1858), acompanhou a Lisboa a sua futura cunhada, D. Estefânia, e em Lisboa assistiu, na qualidade de condestável do reino, ao casamento de D. Pedro V (maio de 1858).

Em 1861 saiu de Lisboa com o infante D. João, em viagem pela Europa, e achava-se em Londres quando recebeu a notícia de que D. Pedro V adoecera gravemente, pelo que urgia o seu regresso a Portugal. Os dois infantes embarcaram logo na Bartolomeu Dias, e desembarcaram em Lisboa pouco depois do falecimento do rei, ocorrido a 11-11‑1861. O infante D. Fernando, ainda criança, morrera dois dias antes do monarca; em dezembro seguinte, nas vésperas do Natal, finava-se o infante D. João, enfermando gravemente D. Augusto. Correram boatos de envenenamento, acusando-se pessoas do paço, e fantasiando-se que o marido da rainha Vitória, o príncipe Alberto, com quem D. Luís jantara na véspera da sua partida, sucumbira, por engano, a um envenenamento preparado para este.

O povo tumultuou pelas ruas. A saída do duque de Loulé do ministério, e de alguns dos outros ministros, que eram os mais alvejados pelas suspeitas populares, concorreu para que a situação se fosse modificando, mas verdadeiramente só houve completo sossego em 1864, depois de sufocada a insurreição militar que rebentara no Minho.

O novo soberano, tendo assumido o governo a 14-11‑1861, convocou para o dia seguinte as cortes, às quais ratificou o juramento feito, e foi aclamado a 22 de dezembro seguinte.

Pensou-se no seu casamento, sendo escolhida a filha mais nova do rei de Itália, Vítor Manuel II, a princesa Maria Pia de Saboia. Realizou-se o consórcio por procuração em Turim a 27-9‑1862, sendo ratificado em Lisboa a 6 do mês seguinte.

Em 1865 houve no Porto uma exposição internacional no Palácio de Cristal, construído para esse fim. Nesse ano caía o ministério progressista histórico perante a fusão de um dos principais grupos desse partido com o partido regenerador. Constituiu-se então um gabinete presidido por Joaquim António de Aguiar (4-9‑1865), sendo sua personalidade proeminente Fontes Pereira de Melo, estadista muito afeiçoado a D. Luís.

A 1-1-1868, em consequência da criação do imposto geral de consumo, criado pela lei de 10-6‑1867, que a opinião pública recebeu mal, deu-se o motim a que se chamou Janeirinha.

Este movimento teve a sua mais ruidosa manifestação no Porto, no 1.° de janeiro, facto que deu origem ao título do jornal portuense O Primeiro de Janeiro, fundado por Gaspar Ferreira Baltar.

O monarca recebeu uma comissão protestatária de portuenses; o ministério demitiu-se, e foi chamado ao governo António José de Ávila, já conde de Avila, que organizou governo com José Dias Ferreira na pasta da Fazenda.

Abertas as cortes a 15 de abril, teve a sessão a marcá-la a atitude assumida pelo conde de Peniche (mais tarde marquês de Angeja), um dos mais enérgicos propulsores da Janeirinha, que atacou Ávila como lesador da liberdade de reunião. As medidas que tinham provocado os tumultos foram revogadas. Dias Ferreira apresentou uma reforma tributária contra a qual gritaram as oposições, protestando contra os vencimentos do alto clero, dos diplomatas e dos funcionários que não trabalhavam, e achando que deviam ser reduzidas as despesas com luxos de representação. Ou se libertava o tesouro da parasitagem, ou se não pagaria mais tributos. Viu-se o governo obrigado a contrair empréstimos com juros elevadíssimos, que ainda mais agravaram a crise política e financeira. Para maior desgraça, a guerra do Paraguai impedia a remessa de dinheiro do Brasil para a Europa, o que muito afetava o crédito português, já vacilante pelas discórdias internas.

Assustava também o país a revolução que rebentara em Espanha em 1868 para derrubar do trono a rainha D. Isabel II. Apelou-se para o recurso das economias, e o ministério de Ávila foi substituído por outro, presidido pelo marquês de Sá da Bandeira, mas onde a personalidade dominante era o bispo de Viseu, D. António Alves Martins, que tomou a pasta do reino. A sua obra, porém, foi apenas burocrática, sem que se entrasse no período das grandes reformas reclamadas.

Em 1869 subiu ao poder um ministério progressista, presidido pelo duque de Loulé. As circunstâncias não melhoravam. Entretanto, chegava a ponto agudo a questão ibérica. Em Espanha decidiu-se, depois da fuga da rainha, procurar um rei, e viram-se em Lisboa, onde havia partidários da união ibérica, cartazes onde se lia: «Viva o senhor D. Luís, chefe dos dois países unidos! portugueses, ponhamos de parte estúpidos preconceitos: Portugueses e espanhóis são irmãos pela religião, pelos costumes, pelo idioma, e sobretudo pelo decidido amor à liberdade». Foi nessa ocasião que D. Luís escreveu uma famosa carta em que afirmava que nascera português, e português queria morrer.

O ministro da Fazenda, conde de Samodães, empreendeu economias, mas pouco tempo se manteve com a sua pasta. O rei cedia 36 contos por ano da sua lista civil, a décima parte do rendimento da dotação da rainha, pagando os príncipes 4 contos por ano para as urgências do tesouro. Compraram-se as linhas férreas do Sul e Sueste, que habilitavam ao empréstimo de 4 milhões de libras contratados em Londres na Casa Goschen. Adjudicavam-se-lhe os rendimentos dos tabacos e das alfândegas para garantir a anuidade do pagamento de 420 mil libras, durante 30 anos.

A 11-8‑1869 o ministério do bispo de Viseu era substituído por um chefiado pelo duque de Loulé, presidente e ministro do Reino, figurando na pasta da Justiça José Luciano de Castro, que era chamado pela primeira vez aos conselhos da coroa. Este gabinete não era do agrado da maioria dos deputados de renome. As eleições tinham decorrido tumultuariamente, e formou-se uma conjura.

O marechal duque de Saldanha, julgando-se ofendido pelo governo de Loulé, promoveu a revolta militar de 19-5-1870. Com as forças que se tinham formado em Entre-Muros, perto de Campolide, onde o marechal residia, avançou sobre o Paço da Ajuda na noite de 18 para 19 e pediu a D. Luís a demissão do ministério. Falou ao rei acompanhado de uma comissão (Sena de Freitas, Silva Lobo, Liberato Branco, D. Diogo e D. Francisco de Sousa, etc.) e obteve a queda do governo. O chefe da revolta, nomeado presidente, preencheu as pastas com partidários do conde de Peniche e do bispo de Viseu, entrando também Rodrigues Sampaio.

Este ministério apenas durou cem dias, levantando contra si todos os partidos organizados. À revolta de 19 de maio respondeu o golpe de Estado de 29 de agosto, pelo qual o monarca demitiu o ministério Saldanha, chamando ao poder Sá da Bandeira, o qual imediatamente cedeu ao conde de Ávila o encargo de constituir o ministério, pois que o velho general só pensara em livrar o soberano da situação difícil em que se encontrava. O novo gabinete formou-se com elementos reformistas, sendo o bispo de Viseu um dos ministros. A 13-9‑1871 demitiu-se esse ministério subindo ao poder Fontes Pereira de Melo, que organizou um gabinete regenerador, o qual se conservou até 1877.

Durante esse largo período deram-se agitados acontecimentos em Espanha. O rei Amadeu viu-se obrigado a abdicar, sendo proclamada a república. Perante a desordem em que decorreu a vida desta, foi restabelecida a monarquia (janeiro de 1875).

Elementos dos partidos histórico e reformista juntaram-se na Granja, a fim de se unirem num só partido — o progressista — os políticos que andavam dispersos. Anselmo Braamcamp, eleito chefe dos históricos, deu grande impulso à ideia, e a 7-12‑1876 instalava-se o novo organismo político («Pacto da Granja»), tendo à sua frente, além de Braamcamp, o bispo de Viseu, Pereira de Miranda, António de Sá Nogueira (já falecera Sá da Bandeira, a 6 de janeiro daquele ano), Saraiva de Carvalho, José Luciano de Castro, Luís Daun e Lorena, Maldonado de Eça, Mariano de Carvalho, Manuel de Jesus Coelho e os viscondes de S. Januário e de Valmor.

No princípio do ano de 1877 demitiu-se o ministério regenerador de Fontes, depois de se conservar no poder durante um período de seis anos, em que se deu ao país a impressão da prosperidade. Seguiu-se o do duque de Ávila (6-3‑1877), que não pôde sustentar-se por lhe faltar maioria. Supunha-se que lhe sucederia o novo partido progressista, mas não aconteceu assim; e quando, em 1878, rebentou um conflito parlamentar, foi chamado outra vez Fontes para constituir gabinete.

Deste facto se originou uma das campanhas de mais vastas consequências que ocorreram em Portugal. Os progressistas atacaram diretamente o rei, acusando-o de patrocinar escandalosamente os regeneradores, isto com grave desprestígio do regime monárquico e incentivo ao desenvolvimento do republicanismo. Anselmo Braamcamp acusou o rei de não haver resolvido a crise conforme as indicações constitucionais, mostrando-se parcial a favor de Fontes. O Diário Popular e o Progresso publicaram artigos violentíssimos. Este último dizia: «O senhor D. Luís lançou mão, como de uma arma de guerra, do poder pessoal». Adiante acrescentava ter o monarca «afastado os progressistas do poder a golpes de Estado», arrojando-se inconstitucionalmente nos braços dos regeneradores, «enodoados pela sua própria crápula». Joaquim Martins de Carvalho, no Conimbricense, chamava aos regeneradores o «partido do rei», e perguntava: «Então voltamos à época do poder pessoal, em que o reinante, em vez de ser o primeiro magistrado da nação, era também o chefe de um bando político?». Apareciam opúsculos soeses, panfletos de prosa contundentíssima.

O nome de D. Luís foi completamente desprestigiado; acusavam-no das faltas mais graves: de haver procurado subir ao trono de Espanha, entrando para isso em negociações com Napoleão III, e não sendo, portanto, a sua célebre carta, em tempo publicada, senão um documento hipócrita; de ter sido cúmplice do marechal Saldanha na revolta de 19-5-1870, com o fim de demitir o ministério de Loulé porque o duque recusara aumentar o subsídio ao Teatro de S. Carlos para que a empresa pudesse contratar certa bailarina de notável formosura, etc.

Alcançou por então grande êxito o jornal de caricaturas de Rafael Bordalo Pinheiro, o qual tinha por título o nome do presidente do conselho: António Maria (12-6‑1879). Em todos os números era caricaturado o rei. O desenhador criou nesse período a famosa figura do Zé Povinho, representativa do povo português.

Os republicanos (Teófilo Braga, Manuel de Arriaga, Elias Garcia, Rodrigues de Freitas, etc.) propuseram-se a deputados nas eleições de 1879, falando num comício celebrado no Teatro da Rua dos Condes, presidido pelo escritor Ramalho Ortigão. A campanha difamatória contra D. Luís durou um ano, ao fim do qual, tendo caído o ministério regenerador (junho de 1879),      D. Luís chamou os progressistas a formarem gabinete.

Os republicanos tomaram mais ímpeto quando se celebrou o centenário de Camões. A maçonaria ajudou a promover essa manifestação, que inquietou o governo e o paço. Organizou-se um grande cortejo (10-6‑1880) que passou entre estrondosas aclamações, nas quais havia um manifesto propósito de assoalhar republicanismo.

Em 1881 levantou-se a questão do projeto de tratado com a Inglaterra relativo a Lourenço Marques e à Índia. Esse projeto, que o governo progressista queria fazer votar nas câmaras, continha cláusulas extremamente desagradáveis para o País. A Grã-Bretanha poderia construir um caminho de ferro até o Transvaal; dar-se-lhe-ia isenção de direitos para as mercadorias inglesas, no porto; consentir-se-lhe-ia embarque e desembarque de tropas; conceder-se-lhe-ia livre-trânsito pelos domínios portugueses no Ultramar, acordo de pautas, edificações de armazéns no términus da linha, sob a direção de agentes ingleses, e licença para os navios britânicos poderem exercer a sua ação fiscalizadora nas águas de Moçambique — devendo ser perpétuas todas estas concessões. Levantaram-se protestos por todo o país. Faziam-se comícios em que falavam oradores republicanos, os quais se aproveitavam da repulsa que o tratado inspirou para promoverem uma agitação, de que resultou a queda do ministério. Por fim concordou-se, ao cabo de longas negociações, em se substituir a cláusula da perpetuidade do tratado pela de um período de 12 anos; em fazer depender o fim das isenções de direitos de alfândega da amortização do capital empregado no caminho de ferro; em ficar dependente de uma convenção especial a passagem das tropas; e em que a polícia dos cruzadores britânicos só seria possível desde que levassem a bordo um oficial português. Quanto à pauta, ficaria em igualdade de condições com a do Transvaal.


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